terça-feira, 26 de agosto de 2014

3 OBSERVAÇÕES EM PSICANÁLISE


FREUD: PRIMEIRAS IMPRESSÕES

FREUD, A ARTE (PRINCIPALMENTE, O CINEMA) E OS ESTUDOS CULTURAIS

NEUROSE OBSESSIVA NO FILME GAINSBOURG - O HOMEM QUE AMAVA AS MULHERES (JOANN SFAR, 2011)


Freud explica. Explica com clareza, com estilo, com riqueza de detalhes e exemplos. Parece não economizar palavras e saber escolhe-las como ninguém. Freud explica historicamente, contextualiza, depois repensa, corrige, ressalva, e anota em suas memoráveis notas de roda pé, cuja  importância da leitura é frequentemente destacada pelos orientadores do estudo da psicanálise. Freud explica através da arte e, principalmente, do mito. Mas acima de tudo, Freud explica com classe, e sua obra, ironicamente, nos hipnotiza. É fácil apaixonar-se por suas passagens marcantes, tanto devido ao poder de síntese, de máximas, como pela capacidade de desenvolver ideias não apenas abstratas como, também, complexas. Assim, seu estilo de escrita indutiva nos revela aos poucos, em suas palavras, "a construção de nosso arcabouço psicológico" (FREUD, [1900] 2001, p. 506). Veremos a seguir alguns exemplos que ilustram estas impressões.

Para iniciarmos, lembremos, então, de uma curiosa nota de rodapé, em O mal-estar na Civilização, sobre a procedência dos primeiros atos culturais da humanidade, valorizando, dentre eles, o domínio do fogo. Nesta nota Freud ensaia uma interpretação - "não inteiramente segura", o próprio adverte - do domínio do fogo como uma renúncia instintual, um prazer infantil, que seria apagar o fogo com um jato de urina. Freud, assim, assemelha a chama do fogo ao falo,  considerando a fruição do ato de apagar o fogo uma disputa homossexual:

Quem primeiro renunciou o fogo a este prazer, poupando o fogo, pode leva-lo consigo e coloca-lo ao seu serviço. Ao amortecer o fogo de sua própria excitação sexual, havia domado a força natural do fogo. Essa grande conquista natural seria então o prêmio por uma renúncia instintual. (FREUD, [1930a] 2010, p. 50)                                                                                                        

 A nota, que motivou outros psicanalistas a escreverem sobre o tema, levou Freud a retoma-la em um artigo, A conquista do Fogo (1932), para a Revista Imago, onde desenvolve esta "renúncia instintual tornada necessária" (FREUD, [1932] 2010, p. 405) relacionando-a com o mito de Prometeu, defendendo sua hipótese por meio de manobras interpretativas que levam em conta as "previsíveis distorções na passagem do fato para o conteúdo do mito" (FREUD, [1932] 2010, p. 401). Assim, demonstrou a eficácia de sua metodologia não apenas para casos clínicos, mas também para uma contribuição em direção ao entendimento mais amplo da humanidade, reafirmando a psicanálise como um estudo interdisciplinar, voltado não apenas para a medicina, mas para outras áreas.

Além do vasto emprego da mitologia para a construção da psicanálise (sendo Édipo e Narciso os mitos onipresentes nesta ciência), Freud debruçou-se também nas criações artísticas de diversos períodos. Em uma frase atribuída ao mestre, denota-se a supremacia da arte em relação a sua pesquisa e, mesmo faltando-nos a indicação exata do local e data da citação (e talvez a veracidade da atribuição), insistimos em usá-la pois podemos verifica-la por toda a obra do psicanalista: "Aonde quer que eu vá, eu descubro que um poeta esteve lá antes de mim". Caso a lacuna referencial venha prejudicar nossa constatação, podemos citar outra frase (esta confirmada bibliograficamente) do texto Delírios e Sonhos na Gradiva de Jensen (1907):
E os escritores criativos são aliados muito valiosos, cujo testemunho deve ser levado em alta conta, pois costumam conhecer toda uma vasta gama de coisas entre o ceú e a terra com as quais a nossa filosofia ainda não nos deixou sonhar. Estão bem adiante de nós, gente comum, no conhecimento da mente, já que se nutrem em fontes que ainda não tornamos acessíveis à ciência. (FREUD [1907] 1924, p. 4-5)

Assim, confinando-se em leituras desde a infância, Freud dissecou a obra dos mais importantes artistas, conferindo a eles o mérito de conhecedores e reveladores do espírito humano, com um diferencial, se comparado a psicanálise: "é uma sutil economia da arte do poeta o fato de ele não deixar que seu herói exprima de forma aberta e integral todos os segredos de sua motivação" (FREUD, [1916] 2010, p. 260).

Ou seja, o que a psicanálise freudiana nos demostra é, em grande parte, proveniente da arte, principalmente de artistas como Goethe, Schiller e Shakespeare. Este último, "o maior dos poetas", por exemplo, serve a Freud incontáveis vezes e, para citarmos uma, escolhemos o protagonista de Ricardo III, cujas atrocidades são motivadas por uma "desvantagem congênita", ilustrando o entendimento psicanalítico de  "exceção", no texto Alguns tipos de caráter encontrados na prática psicanalítica (1916).

Em relação a Goethe, Freud percebeu e declarou que sua obra produziu sentidos posteriormente confirmados pela psicanálise, como por exemplo as "primeiras inclinações [que] tomam por objeto pessoas de nosso próprio círculo familiar", expressada pelo poeta em uma nota para sua amante: "Ah, em tempos idos foste minha irmã ou esposa" (GOETHE apud FREUD, [1930b] 2010, p. 359); ou sua percepção a respeito do conteúdo da vida onírica, designados no poema À lua:
Aquilo que, não sabido
Ou não pensado pelos homens,
No labirinto do peito
Vaga durante a noite. (ibidem, p. 360)

Schiller nos aparece como outra de suas fontes de inspiração, muitas vezes citado de forma a expressar suas próprias angústias ou glórias. Por exemplo, ao defender a psicanálise das críticas, tanto da "multidão" como "dos círculos especializados", Freud argumenta com uma frase da trilogia Wallenstein: "Se a ideia não fosse tão danadamente esperta, seríamos tentados a dizer que é realmente estúpida" (SCHILLER apud FREUD, [1933] 2010, p.302). Já para justificar sua empreitada biográfica ao tratar de Leonardo DaVinci, por exemplo, é citado outro trecho do poeta alemão: "Não pretendo 'macular o radiante e arrastar na lama o sublime'". (FREUD, [1910] 2010, p. 114)

Mas, assim como Goethe e Shakespeare, também encontramos Schiller como uma espécie de aura percursora dos descobrimentos freudianos. Em A psicologia das Massas e Análise do Eu, Freud mostra como o dístico, Sprüche, descreve a "diminuição da capacidade intelectual, experimentada pelo indivíduo que se dissolve na massa" (FREUD, [1921] 2010, p. 25). Nas palavras de Schiller, "Cada um, olhado separadamente, é passavelmente arguto e sensato;/ Se estão in corpore, logo se revelarão uns asnos" (Ibidem, p. 25)

Antes de cessar a respeito das inferências e auxílio da arte na obra de Freud, citaremos uma última. Esta refere-se a empreitada citada anteriormente; uma investigação da vida de Leonardo Da Vinci. Nela, a partir de uma pequena seleção de indícios antes relevados por outros biógrafos, Freud desconstrói a formação neurótica obsessiva do gênio, fazendo uma incursão no universo da pintura com a análise estrutural de algumas da mais valiosas concepções de Da Vinci, produzidas quando sob o patrocínio do governador de Milão, Ludovico Mouro. Dentre elas, Freud lança seu olhar aguçado no misterioso sorriso de Monna Lisa, entrelaçando, então, algumas diferenças e semelhanças entre o retrato, o quadro de San'Anna com a Virgem e o Menino e o cartão de Londres[1]. O material utilizado por Freud para construir a complexa rede que nos ensina sobre esta personalidade, vai além da pintura, passando por uma cuidadosa análise da deusa Mut, da mitologia egípcia, e uma investigação a cerca de pequenos erros gramaticais encontrados nas anotações de Da Vinci. Assim, Freud mostra a relevância dos detalhes, afirmando, em uma lição para analistas iniciantes, que "nada é pequeno demais". (FREUD, [1910] 2010, p. 193)

Um exemplo como este a cima nos remete a outra faceta dos textos de Freud. Além de fornecer conselhos ao leitor, Freud, muitas vezes, escreve em tom de desabafo, quase sempre defendendo a reputação de sua ciência contra ataques moralistas, formalidades acadêmicas e discordâncias dentro do seu círculo profissional. Este seu ímpeto "humano demasiado humano" de rebelar-se, mesmo que sempre cordialmente, pode suscitar no leitor certa afetividade e confiança. Ao valorizar as críticas e fracassos no meio psicanalítico, Freud faz transparecer sua modéstia, como que nos deixasse perceber (diferente de personalidades que colocam-se acima de qualquer suspeita) a importância conferida, a ponto de pesquisar e ler, sobre o que é dito a seu respeito e de sua ciência. Mesmo que, por vezes, negue sentir-se afetado pela oposição, como na ocasião em que comparou-se com Breuer ao receberem, de um conhecido neurologista, uma resenha pouco elogiosa da publicação dos Estudos de Histeria: "eu fui capaz de rir da crítica insensata, mas Breuer magoou-se e perdeu o alento" (FREUD, [1925] 2010, p. 98). Já em relação a Jung, após o rompimento, Freud demonstra uma certa crueldade cínica, como vemos ainda na "Autobiografia": "Para primeiro presidente favoreci a escolha de C. G. Jung, uma medida realmente infeliz, como depois se verificou" (FREUD, [1925] 2010, p. 136). Outras vezes, na maior parte, suas advertências são indiretas, aparentemente impessoais, porém bastante pontuais e com um toque de humor:
Ao longo desses anos, li cerca de uma dúzia de vezes, em informes sobre as atividades de certo congressos e encontros de sociedades científicas, que a psicanálise estava definitivamente liquidada! A resposta teria de ser como o telegrama que Mark Twain enviou ao jornal que erradamente noticiara a sua morte: "Notícia de meu passamento fortemente exagerada". Após cada uma dessas declarações de que havia morrido, a psicanálise adquiriu novos seguidores e colaboradores e fundou novos órgãos. Ser declarada morta não deixa de ser um progresso em relação a ser enterrada em silêncio! (FREUD, [1914] 2010, p. 283)

Enriquecido por essas passagens de menor importância científica, mas de enorme valor para quem estuda levando em conta a subjetividade do autor, do estudo dos primórdios da vida psíquica, até a relação do ser humano  com a morte e com guerra, Freud traça os parâmetros de uma ciência que permite uma análise individual dos meandros da formação da personalidade, enfrentando dogmas (assim como qualquer cientista que se preze) e abrindo caminho para um século cujos hábitos sociais sofreram grandes mudanças, muitas vezes ditadas a partir de suas ideia.

A importância de Freud é fundamental, pontuada diariamente nas diversas análises sociais; seja em colunas de jornais, livros, artigos, exposições de arte ou filmes. O interesse por Freud atinge todas as classes, mas, principalmente, a dos artistas e intelectuais. Dos cineastas mais escancaradamente freudianos, como Buñuel, Hitchcock, Bergman, Woody Allen e Lars Von Trier, até os filmes não autorais, blockbusters, que aparentemente nada pretendem "com Freud", dificilmente uma história passa ilesa pela psicanálise. As referências estão sempre lá, mesmo que o filme não trate de seres humanos.

Assim, após a fundação da psicanálise, não apenas a arte ganhou um novo tema (como o surrealismo, que talvez não tivesse existido sem ela), mas, também, a crítica literária ganhou uma nova ferramenta para analisar qualquer tema tratado pela poética. Ora, o próprio Freud cunhou a arte como uma das mais nobres atividades desenvolvidas pelo aparelho psíquico como forma de sublimação, logo qualquer concepção artística é passível pelo crivo da psicanálise.

Assim como Salvador Dali foi magnetizado pela teoria do sonho, hoje a psicanálise continua cativando novos adeptos e crescendo para diversas áreas de pesquisa. Frequentemente relacionada ao marxismo, um dos caminhos prosseguidos por essa ciência foi o da crítica social e dos estudos culturais - assim como Freud propôs tantas vezes como em A psicologia das massas e análise do Eu (1921), O mal-estar na civilização (1930a) ou na Revista Imago. Dentre os adeptos pode-se destacar o pensador (filósofo, psicanalista, sociólogo) esloveno, Slavoj Zizek. Partindo de uma leitura cuidadosa de Lacan (e consequentemente de Freud), Marx e Hegel, Zizek concentra o seu trabalho na análise da sociedade por meio dos discursos ideológicos que encontra em produções culturais, principalmente as mais populares. Suas análises, quase sempre inusitadas, atraem a atenção da mídia, e sem dúvida, na pior das hipóteses, fazem um bom trabalho de divulgação científica para o pai da psicanálise, através de uma linguagem bastante acessível.

Tendo colocado minhas primeiras impressões a respeito da psicanálise e, em seguida, afirmado a existência de uma relação praticamente insolúvel entre ela e a arte, devemos, agora, arriscar, mesmo que brevemente, extrair algum elemento da enorme construção de Freud para aplicá-lo a uma manifestação artística. Assim, como exemplo citamos a provocação do cantor francês, Serge Gainsbourg, a toda a sociedade ao gravar a música "Lemon Incest" (1984) junto com sua filha, Charlotte Gainsbourg. Como o próprio título da canção explicita, trata-se do amor incestuoso que, como se não bastasse para enfurecer os moralistas de plantão, foi acompanhada por um vídeoclip, onde pai e filha cantam em cima de uma cama: ela, com 12 anos, de camisa e calcinha; ele, com mais de 50 anos, apenas vestido com uma calça jeans. A letra, bastante sucinta, é suficiente para chocar semelhantemente como a sociedade vitoriana chocou-se com a teoria da sexualidade nas crianças na virada do século 18 para o 19.


Lemon Incest

Inceste de citron
lemon incest
Je t'aime, l'amour, je t'aime plus que tout
Naïf comme écran de Nierdoi Sseaurou
Tes baisers sont aussi ???
Inceste de citron
lemon incest
Je t'aime, l'amour, je t'aime plus que tout
L'amour que nous ???
C'est le plus beau, le plus violent
Le plus pur, plus ??
Il excuse, excuse
Délicieux enfant
Ma viande et mon sang
Oh mon bébé, mon âme
Inceste de citron
lemon incest
Je t'aime, l'amour, je t'aime plus que tout
Naïf comme écran de Nierdoi Sseaurou
Tes baisers sont aussi ???
Inceste de citron
lemon incest
Je t'aime, l'amour, je t'aime plus que tout
L'amour que nous ???
C'est le plus beau, le plus violent
Le plus pur, plus ???
Il excuse, excuse
Délicieux enfant
Ma viande et mon sang
Oh mon bébé, mon âme
Incest de citron
lemon incest

Incesto de Limão

Incesto de limão
Incesto de limão
Eu te amo, amo, te amo mais que tudo
Ingênuo como uma tela de Nierdoi Sseaurou
Os teus beijos são tão doces
Incesto de limão
Incesto de limão
Eu te amo, amo, te amo mais que tudo
O amor que nós nunca vivemos juntos
É o mais belo, o mais violento
O mais puro, o mais inebriante
Desculpe, desculpe
Deliciosa criança
Minha carne e o meu sangue
Oh meu bebê, minha alma
Incesto de limão
Eu te amo, amo, te amo mais que tudo
Ingênuo como uma tela de Nierdoi S[...]
Os teus beijos são tão doces
Incesto de limão
Incesto de limão
Eu te amo, amo, te amo mais que tudo
O amor que nós nunca vivemos juntos
É o mais belo, o mais violento
O mais puro, o mais inebriante
Desculpe, desculpe
Deliciosa criança
Minha carne e o meu sangue
Oh meu bebê, minha alma
Incesto de limão
Incesto de limão



Com uma personalidade forte e sedutora, esta não foi a primeira vez que Serge Gainsbourg provocou a opinião pública. Em 1969, junto com Jane Birkin, sua então amante e futura mãe de Charlotte, ele gravou a canção "Je t'aime... moi non plus". Apesar de ter sido um grande sucesso, a música foi proibida em diversos países devido ao seu conteúdo erótico. Originalmente escrita e gravada, em 1967, em parceria com outra de suas célebres amantes, Brigitte Bardot, não foi possível, então, lançar a música, pois Bardot era casada com outro homem, ficando famosa, portanto, após dois anos na voz de Birkin.

Este episódio da vida do cantor francês é contado no filme-biografia Gainsbourg - O Homem que amava as mulheres (Joann Sfar, 2011), e, tendo em vista a dificuldade em acessar o real, o verídico da vida do cantor, e o objetivo deste artigo (uma aplicação da teoria psicanalítica e não o desvelamento de uma personalidade histórica), é a partir deste filme que verificaremos as possibilidades de fazer uma análise, não factual, mas da representação, do Gainsbourg personagem do cinema.

O filme, baseado em fatos reais, mistura-se com a experiência do diretor que, por sua vez, antes de estrear no cinema, era (e continua sendo) autor histórias de ficção em quadrinhos. Bastante autoral, desta forma, ele não propõe uma biografia fidedigna, mas uma homenagem ao cantor, o que é justificado por Joann Sfar em um depoimento escrito ao término do filme, antes dos créditos rolarem: "Amo demais Gainsbourg para trazê-lo à realidade. Não são as verdades dele que me interessam, são suas mentiras".

Podemos, então, listar algumas perspectivas para análise do personagem Gainsbourg no filme: a) O surgimento de um "amigo imaginário" na infância  para lidar com o trauma da guerra, atribuído a um menino judeu habitando a Paris invadida pelos nazistas; b) Como este "amigo imaginário" ganhou proporções de um superego (ou alterego? fica a dúvida) que,  paradoxalmente, através de uma intensa pulsão de vida, catexizava um comportamento autodestrutivo; c) Como sua constituição edipiana favoreceu o seu fortalecimento artístico e comprovou que este "amigo imaginário" não é sintoma de uma patologia psicótica, mas sim, uma compensação diante de frustrações e traumas.










O amigo imaginário de Gainsbourg na infância e na maturidade

 

Sabemos da possibilidade de outras perspectivas interessantes para análise, mas no momento, ficaremos com essas. E para este texto, por uma razão de limites (conhecimento, espaço e tempo) focaremos apenas na última, c), defendendo uma formação de sintomas neuróticos perante traumas sociais e frustrações familiares.

Filho de um pianista e uma dona de casa, Gainsbourg (nascido Lucien Ginsburg) era artisticamente dotado e aos 11 anos estava matriculado na Academia de Pintura de Montmatre. Ainda nesta idade, rebelou-se contra o seu pai quando viu-se obrigado a tocar piano. Em uma virada edipiana bem sucedida aproveitou o "amigo imaginário" que havia criado para lidar com o nazismo (caricatura dos judeus, com a cabeça imensamente maior que o corpo, quatro braços e quatro pernas), transformando-o em outro monstruoso, porém elegante, amigo que, na sua imaginação tocava piano nos bares parisienses, assim com seu pai. E foi através deste "amigo" que Gainsbourg encontrou o caminho para identificar-se com a figura paterna. Após esta disputa, vencida de forma terna pelo filho, os dois alcançaram uma relação saudável de admiração, onde o papel da mãe foi o de proteger o filho dos eventuais ímpetos, considerados por ela, agressivos do pai, sem no entanto sair de seu lugar de esposa.

Dentro deste cenário, Gainsbourg consegue delinear uma neurose obsessiva, recalcando o ódio pelo seu pai através da formação substitutiva de seus representantes  instintuais - a identificação - que não se sustentará na medida em que a vida avança, levando-o a deslocar este afeto negativo e colocando "em jogo uma mecanismo de fuga por meio de proibição e escapatórias" (FREUD, [1915] 2010, p. 136). No caso de nosso personagem, a "escapatória" levaram-no a uma intensa dedicação à arte e à  compulsão por cigarro e álcool, tornando-o não apenas um maravilhoso artista mas, também, um alcólatra; um obsessivo compulsivo. Porém não podemos deixar de levar em conta, como motivo da sublimação e compulsão, a intensa pulsão de vida, provocada pelo trauma da guerra. Ora, paradoxalmente, até mesmo a autodestruição é sintomática do excesso da pulsão de vida, pois quando brinca-se com a morte, depara-se com a vida. Mas não é apenas através deste paradoxo que enxergamos a predominância de Eros nesta narrativa errante: Eros, a pulsão de vida, está presente também no óbvio, no lado erótico que marcou a figura do cantor, um mito da cultura pop francesa e do romance.

Em um artigo mais extenso e dedicado, seria interessante analisar com mais afinco, toda a formação psíquica do cantor ou de sua representação, seja no cinema ou na literatura. Vale lembrar, para finalizar, que Serge Gainsbourg interessava-se por psicanálise[2] e, provavelmente, estava consciente de sua relação provocadora frente a sociedade, mesmo porque o entendemos aqui, hipoteticamente, como um neurótico (que entende as "regras") e não um psicótico (que não consegue estabelecer um vínculo com a realidade).


BIBLIOGRAFIA (ORDEM CRONOLÓGICA ORIGINAL)

FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. [1900]. Trad. Walderedo Ismael de Oliveira. Rio de janeiro: Imago Ed., 2001.

__________ "Delírios e Sonhos na Gradiva de Jensen" [1907]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume IX (1906-1908): "Gradiva" de Jensen e outros trabalhos. Trad. James Strachey (inglês). Disponível em: < http://www.ebah.com.br/content/ABAAABnW0AA/vol-9-gradiva-jensen-outros-trabalhos>. Acesso: 22 de agosto, 2014.


__________ "Uma recordação de infância de Leonardo Da Vinci" [1910]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 9: Observações sobre um caso de neurose absessiva [o homem dos ratos], Uma recordação de infância de Leonardo Da Vinci e outros textos (1909-1910). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.



__________ "Contribuição à historia do movimento psicanalítico" [1914]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 11: Totem e tabu, Contribuição a Historia do movimento psicanalítico e outros textos (1912-1914). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "A Repressão" [1915]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 12: Introdução ao narcisismo, ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.


__________ "Alguns tipos de caráter encontrados na prática psicanalítica" [1916]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 12: Introdução ao narcisismo, ensaios de metapsicologia e outros textos (1914-1916). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "Psicologia das Massas e Análise do Eu" [1921]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 15: Psicologia das Massas e Análise do Eu e outros textos (1920-1923). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "Autobiografia" [1925].  In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 16: O eu e o id, Autobiografia e outros textos (1923-1925). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "O mal-estar na civilização" [1930a]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 18: O mal-estar na civilização, Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos (1930-1936). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.


__________ "Prêmio Goethe" [1930b]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 18: O mal-estar na civilização, Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos (1930-1936). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "A conquista do fogo" [1932].  In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 18: O mal-estar na civilização, Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos (1930-1936). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

__________ "Novas conferências introdutórias" [1933]. In: Freud, Sigmund. Obras Completas volume 18: O mal-estar na civilização, Novas conferências introdutórias à psicanálise e outros textos (1930-1936). Trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.






[1] O cartão de Londres, também chamado de "cartão da casa de Burlington", é um desenho de Leonardo da Vinci, encontrado em uma das folhas dos seus diários. Está no acervo do London National Gallery.

[2] De acordo com a biografia Serge Gainsbourg - Um Punhado de Gitanes (Sylvie Simmons, 2004, editora Barracuda), o cantor era fortemente influenciado pelo amigo Dali, que, por sua vez, era obcecado por psicanálise.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

JORNALISMO CULTURAL ALTERNATIVO


 Publicado na Revista Alterjor, Vol. 2, No 8 (4)
RESUMO
ESTE ARTIGO INVESTIGARÁ A PRODUÇÃO, DISTRIBUIÇÃO E CONSUMO DO JORNALISMO CULTURAL ALTERNATIVO, ABORDANDO ALGUNS CONCEITOS, PROPOSTOS ANTERIORMENTE NO MEIO ACADÊMICO, QUE DISTINGUEM O JORNALISMO ALTERNATIVO DE OUTRAS FORMAS DE JORNALISMO, ASSIM COMO ABORDARÁ  A IMPORTÂNCIA DO USO DE LINGUAGENS ADEQUADAS NA CRÍTICA DA ARTE PARA ESTE JORNALISMO QUE CONSERVA-SE FORA DA GRANDE IMPRENSA.

PALAVRAS CHAVES
JORNALISMO CULTURAL; CONVERGÊNCIA/HIBRIDAÇÃO; IMPRENSA ALTERNATIVA; LINGUAGEM; VANGUARDA.


INTRODUÇÃO                                                                                                                    


O Jornalismo Alternativo é frequentemente visto, no Brasil, como aquele que se opunha ao governo no período do regime militar (1964 - 1985), representado por veículos como O Pasquim e Opinião. De fato, este é um exemplo correto, porém, não deve ser restringido a isso. O jornalismo alternativo pode ser a voz de qualquer tipo de dissidência, seja às políticas ttalitárias, liberais, ou mesmo às estruturas culturais e qualquer outra forma de organização estabelecida. Por isso, ainda hoje, mesmo sendo o Brasil um país democrático, e que dispõe da tecnologia dos novos métodos de produção e distribuição, ele continua a ter seu papel, mas com outras implicações condizentes com o contexto atual.

Com o poder estatal cada vez mais enfraquecido, devido a absorção de políticas neoliberais, principalmente desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, muitas funções sociais, antes restritamente de incumbência dos órgãos públicos, estão sendo delegadas às instituições privadas, por meio de leis de incentivo, sob o emblema da "responsabilidade social". Além do mais, a tecnologia e a informação estão mais acessíveis à população, propiciando cada vez mais a sua participação ativa no discurso político-cultural.

Neste cenário, a principal diferença entre a grande imprensa e a imprensa alternativa é que, enquanto a primeira trata suas notícias com hipotética imparcialidade e objetividade, – e sendo ela mesma uma estrutura poderosa e dominante –  a segunda, a imprensa alternativa, salvo exceções, adota uma posição, que buscará defender em nome de uma ideologia e, geralmente, na contramão do que a grande imprensa está fazendo.

No entanto, existem diversas maneiras de praticar o jornalismo alternativo, sendo ele flexível – assim como a grande imprensa de países democráticos –, em oposição às práticas midiáticas monolíticas encontradas em regimes totalitários.

No caso do jornalismo cultural, em sua forma alternativa, não é somente uma resposta à hegemonia da indústria cultural, mas também a outros fatores que envolvem o processo de comunicação da grande imprensa. São eles:
  • os modelos de financiamento, distribuição e produção praticados por veículos tradicionais que estão acomodados no sustentáculo de grandes organizações e cujo público já está cativado pela fórmula utilizada, muitas vezes engessada há muito tempo, dispensando, assim, os riscos de experimentações tecnológicas.
  • e a linguagem homogênea da grande imprensa que, muitas vezes, trata todos os temas como se fossem uma reportagem recorrente e morna, por exemplo, sobre a importância da ginástica laboral em call centers.

Como a ideia deste artigo nasceu da frase de Claudney Ferreira na publicação Princípios Inconstantes: "Com as possibilidades digitais, cada vez mais, criar, produzir e veicular informações culturais se confunde com a própria expressão artística" (2010), e a minha hipótese é de que a imprensa alternativa tem um papel historicamente importante no desenvolvimento do jornalismo, pretendo traçar uma linha entre os dois tipos de imprensa a fim de entender as vantagens, fraquezas e possibilidades do jornalismo alternativo, afunilando o debate no escopo dos veículos especializados na cobertura cultural e no jornalismo literário, por meio da história, dos contextos e da linguagem.

É comum que quando falamos sobre o jornalismo dito "alternativo", nos deparamos com alguns estigmas que tratam o conceito como pretensioso. Mas para desanuviar e legitimar este termo, podemos recorrer a trabalhos e livros acadêmicos sobre o assunto. Dentro do conjunto de obras verificadas, a mais recente, foi o trabalho do professor escocês, Chris Atton, que possui quatro livros publicados no assunto,  e  um artigo do professor de Mídia e Comunicação, da Áustria, Christian Fuchs, que também investiga a imprensa alternativa. No Brasil, verifiquei que os jornalistas Daniel Piza e Elizabeth Lorenzotti reconhecem o termo, em seus livros, Jornalismo Cultural (2004, p. 39) e Suplemento LiterárioQue Falta Ele Faz! (2007, contracapa), porém sem se aterem a ele.

Outras leituras que auxiliam no embasamento deste artigo são as investigações de Noam Chomsky e Edward S. Herman ([1988] 2003) sobre a manipulação do público pelo poder político e econômico na mídia; as diferentes formas de consumo de informação que estão emergindo conforme as possibilidades das novas mídias, pesquisada por Lúcia Santaella e Henry Jenkins; trechos de alguns clássicos da Escola de Frankfurt; além de diversos fragmentos de intelectuais dos estudos culturais como Raymond Willliams, Stuart Hall, Slavoj Zizek e artigos de jornais e revista.

Para organizar o artigo, o texto foi divido em quatro partes: a primeiro investigará o conceito de cultura que abrange o Jornalismo Cultural; a segunda parte, dará enfoque a dois modelos de consumo midiático, propostos por Lúcia Santaella e Henry Jenkins; a terceira parte apresentará o entendimento, neste artigo, da imprensa alternativa a partir do livro Alternative Journalism (2008) de Chris Atton e James Hamilton, e do artigo de Christian Fuchs, "Alternative Media as a Critical Media" (2010); a quarta parte buscará entender a situação atual do jornalismo cultural, principalmente, no Brasil, diante de suas relações com a indústria cultural e a pós-modernidade. Além disso veremos, como sugestão para a prática do da crítica de arte que pode ser usado na imprensa alternativa, um resumo do brilhante diálogo entre Gilbert e Ernest: dois personagens criados por Oscar Wilde para discutir o papel do crítico de arte, no artigo, "O crítico como artista" publicado primeiramente em 1891, no livro Intentions.[1]

Estudar a mídia contemporânea é, sem dúvida, uma tarefa complexa e, por isso, estou certa de que muitas opiniões e pontos de vista foram esquecidos e relevados. Mas ainda assim, procuramos formular um esclarecimento a cerca da situação das mídias que tomam a cultura como objeto, tendo como principal força motriz minhas experiências e gostos pessoais. Assim, esta pesquisa é, para mim, explanadora e prazerosa.

QUESTÕES CONCEITUAIS

“Media is a word that has come to mean bad journalism”
Graham Green
                                   
Para discorrer sobre o Jornalismo Cultural, praticado na grande imprensa ou nos veículos alternativos, devemos, inicialmente, partir de alguns esclarecimentos de caráter conceitual dos termos cunhados como protagonistas deste artigo, a saber: "cultura", "consumo midiático" e "alternativo".

            1 - Sobre a cultura do Jornalismo Cultural
A cultura abordada pelo Jornalismo Cultural possui menos abrangência que o sentido antropológico alcançado pela palavra e definido por Edward Burnett Tylor, no século 19, como:
[...] aquele complexo inteiro que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e aptidões adquiridos pelo homem como membro da sociedade. (TYLOR, 1958, p. 1).

No artigo "Cultura no Jornalismo Cultural", Denise da Costa Oliveira Siqueira e Euler David de Siqueira falam sobre a incoerência de existir, nos jornais, um caderno chamado cultural se partimos do princípio de que tudo o que envolve hábitos e aptidões humanas, desde a produção de livros até os processos judiciários e legislativos, o desenvolvimento de tecnologias, as relações sociais, e até mesmo, como exemplificado por eles, a fabricação de mesas e automóveis, são produções culturais, tal qual as entendemos antropologicamente. Ou seja, interpretando cultura nesta acepção, todos os cadernos dos jornais seriam culturais.

Um dos itens escolhidos por Dietrich Schwanitz para compor seu livro Cultura Geral - Tudo o que se deve saber (2007), é o jornalismo cultural. Nele, Schwanitz conta que a palavra folhetim, empregada aos cadernos de cultura, "vem do francês feuilleton, que significa folha pequena. [O feuilleton] foi criado pelo abade Geoffroy para o Journal des Débats, em cerca de 1800, e, originalmente, destinava-se apenas à crítica de teatro." (SCHWANITZ, 2007, p. 406)

Voltando ao artigo de Siqueira e Siqueira, para entender o sentido da palavra cultura, quando usada no contexto jornalístico, os autores fazem um retrospecto do termo (herdado do latim, colere, que significa "cultivar")[2], até meados do século 13, e analisam seu uso para diferentes implicações das ciências humanas hoje.

É interessante notar que o sentido do termo sofre uma transformação, passando do cultivo de alguma coisa para cultura como uma ação de aprimorar o homem. Não obstante, da cultura da terra à cultura do espírito humano, tem-se a passagem de um plano concreto para um plano abstrato: o pensamento.

[...]

Ao longo do século XVIII, no Iluminismo, cultura se refere à formação, à educação do espírito, da alma. Em seguida, houve uma inversão nessa estrutura: passando a cultura – ação de educar – a designar o indivíduo que fosse ou não seu portador. De uma ação, instruir, passa-se a um estado: ter ou não ter cultura. Nesse momento, no Iluminismo, a oposição Cultura x Natureza se cristaliza. (SIQUEIRA e SIQUEIRA, 2007)

Para concluir o que difere o Jornalismo Cultural de jornalismo como um todo (que toma como objeto a economia, o cotidiano, a política e a tecnologia), Siqueira e Siqueira invocam o estudo do antropólogo francês Denys Cuche sobre a dicotomia Zivilization e Kultur, na Alemanha do século 18. Para os intelectuais alemães, que fizeram esta distinção, Zivilization eram as práticas das cortes influenciadas pela noção francesa de civilização. Nessa época, os franceses adotaram o desenvolvimento científico e tecnológico como valores supremos, baseados no "desprendimento do homem da irracionalidade do mundo natural, selvagem e desordenado [que], para os intelectuais alemães implicava formas ilusórias, epifenomenais e não verdadeiras". (SIQUEIRA e SIQUEIRA, 2007). Kultur, por sua vez, era defendida pelos intelectuais alemães como a "verdadeira e profunda cultura de um povo, seria a oposição simétrica da noção de civilização, algo superficial e efêmero". A partir desta perspectiva, o Jornalismo Cultural se aproxima do Kultur:

[...] ao expressar valores, ideias e modos profundos de ser de um povo, revelando aspectos internos, ocultos, profundos. [...] os cadernos culturais poderiam trazer a marca de um grupo social, suas realizações subjetivas e que dificilmente têm algo a ver com o avanço tecnológico, com o grau de domínio do homem sobre a natureza ou o quanto um povo estaria mais “adiantado” do que outro (SIQUEIRA e SIQUEIRA, 2007).

Ao terminarem a reflexão sobre o que entendemos por cultura no Jornalismo Cultural, Siqueira e Siqueira atentam para uma reviravolta no conceito:

Nos cadernos culturais apareceriam elementos que expressariam a forma de ser de um povo. A dança seria uma dessas manifestações de um grupo social que são únicas e não comparáveis. A ênfase de uma parte do jornal como sendo eminentemente cultural parece obedecer à mesma dicotomia entre civilização e cultura para os intelectuais alemães. Assim, vão aparecer temas ligados às artes, às letras, à filosofia, à religião, à dança, enfim, assuntos que valorizam as realizações interiores e espirituais. No entanto, o processo contemporâneo de comercialização e prestação de serviços através dos cadernos culturais parece colocá-los mais próximos do conceito de Zivilization do que daquele de Kultur. (SIQUEIRA e SIQUEIRA, 2007).

Deve-se citar também o momento atual da arte que, a partir das inovações tecnológicas, cria experiências virtuais e novas formas de distribuição e relação profissional. Este é o caso, por exemplo, do Creator's Project uma rede global, para artistas que "estão usando a tecnologia [digital] para expandir os limites da expressão criativa"[3]. Além da plataforma digital com o perfil de mais de cem artistas dos Estados Unidos, China, Brasil, Inglaterra, França, Alemanha e Coreia do Sul, o Creator's Project organiza eventos de música, cinema, arte e debate, e, ainda, patrocina o The Studio, um programa de produção e distribuição do trabalho de artistas independentes, mantendo os direitos intelectuais em propriedade do artista. Ao ver a produção de arte por este ângulo (da dependência da evolução das ciências tecnológicas e do apoio de grandes empresas com interesses econômicos _ que, neste caso, é uma iniciativa da Intel em parceria com a Vice), percebe-se uma prática cultural próxima ao conceito de Zivilization.

Porém, por outro lado, a linguagem e a mensagem explícita nesses trabalhos artísticos (mesmo que patrocinados e suportados pela indústria tecnológica) continuam refletindo questões de caráter espiritual, reflexivo e até possibilitando uma conexão emocional com a ciência, devido ao fato de muitas ideias apenas serem viáveis de se realizar por meio da tecnologia[4]. Assim, a cultura da arte digital, como objeto do Jornalismo Cultural, volta novamente a encontrar-se com a Kultur.

Pode-se notar, também, que foi deste termo que Max Horheimer e Theodor W. Adorno se apropiaram para escrever sobre a indústria cultural, (em alemão, Kulturindustrie) no livro Dialética do Esclarecimento.

            2 - Modelo de consumo midiático
Entendida a cultura que o Jornalismo Cultural abrange, veremos com base na teoria da "cultura digital", de Lúcia Santaella (2003) e a "cultura da convergência" (2008), de Henry Jenkins _ como a sociedade pós-moderna e globalizada consome informação.

Esse processo de consumo (que também é um processo cultural), de acordo com Santaella, evolui conforme o advento de novas tecnologias, a qual a autora denomina "eras culturais". São estas:  cultura oral,  cultura escrita,  cultura impressa, cultura de massa e a mais atual: a cultura digital.

Estas formas de cultura são definidas pelos meios utilizados para a produção, distribuição e consumo de mensagens, e a passagem de uma era para outra se dá gradativamente. Nas palavras de Santaella, "uma forma comunicativa e cultural vai se integrando na anterior, provocando nela reajustamentos e refuncionalização" (SANTAELLA, 2003a, p. 52).

No livro Da cultura das mídias à cibercultura: o advento do pós-humano (2003a), Santaella explica que, nos anos 1980, com o surgimento de novas tecnologias como o videocassete, a fotocopiadora, o controle remoto e a TV a cabo, o público passa a ter mais facilidade para optar pelo tipo de informação que deseja e, consequentemente, passa a demandar conteúdo mais heterogêneo. Este novo padrão de consumo se difere da cultura de massa que é, essencialmente, homogênea, fruto da produção em escala industrial, elaborada por poucos e consumida por muitos.

Esta demanda por conteúdo heterogêneo começou a acontecer em meio à transição entre a cultura de massa e a cultura digital. Esta fase é chamada por Santaella de "cultura das mídias", quando, frente às novas tecnologias dos anos 1980, o público saiu da "inércia da recepção de mensagens impostas de fora e [foi treinado] para a busca da informação e do entretenimento" que deseja. (ibid, p. 16)

A cultura das mídias é marcada, então, por uma convivência dos diferentes meios, inaugurando "uma dinâmica que, tecendo-se e se alastrando nas relações das mídias entre si, começava a possibilitar aos seus consumidores a escolha entre produtos simbólicos alternativos" (ibid, p. 53), enquanto a predecessora, cultura digital, apresenta a convergência das mídias, onde um único aparelho transmite mensagens de todas as mídias, "conectando potencialmente qualquer ser humano no globo numa mesma rede gigantesca de transmissão e acesso". (ibid, 2003a, p. 71)

Muito próximo ao conceito de cultura digital, de Lúcia Santaella, está o conceito de "cultura da convergência", de Jenkins. As principais diferenças entre Santaella e Jenkins é que, para o segundo, a "convergência não ocorre por meio de aparelhos [mas sim], dentro dos cérebros de consumidores individuais e em suas interações sociais com outros", influindo diretamente (assim como na cultura digital de Santaella) no processo de produção de bens simbólicos.

Para Jenkins, "convergência representa uma transformação cultural, à medida que consumidores são incentivados a procurar novas informações e fazer conexões em meio a conteúdos de mídias dispersos" (JENKINS, 2008, p. 30). A "cultura da convergência" se dá a partir do surgimento de uma cultura participativa, viabilizada pela interatividade das novas mídias. Com isso, o fluxo midiático unilateral produtor-consumidor foi colocado em xeque e, cada vez mais, os consumidores participam ativamente na produção daquilo que é oferecido pelos meios de comunicação.

Entender a "cultura da convergência" e a "cultura digital" é fundamental, mas não o suficiente para garantir a sobrevivência e a qualidade de qualquer veículo de comunicação. De acordo com Jenkins, o futuro das mídias depende também do equilíbrio entre duas tendências hoje em curso[5]. O autor alega que:

[...] por um lado, novas tecnologias reduziram os custos de produção e distribuição, expandiram o raio de ação dos canais de distribuição disponíveis e permitiram aos consumidores arquivar e comentar conteúdos, apropriar-se deles e colocá-los de volta em circulação de novas e poderosas formas. Por outro lado, tem ocorrido uma alarmante concentração de propriedade dos grandes meios de comunicação comerciais, com um punhado de conglomerados dominando todos os setores da indústria de entretenimento". (JENKINS, 2008, p. 46)

De acordo com o autor, este fenômeno divide a opinião entre aqueles que acreditam que não haverá mais controle da informação transmitida pelos meios, e aqueles que temem a centralização desse controle nas mãos de uma minoria. Para Jenkins, existe um meio-termo.

Em todos os casos, na sociedade democrática, a comunicação acontece nos dois sentidos entre o emissor e o receptor, porém, com algumas exceções[6] existe, nessa comunicação, um ruído, uma influência do mercado que anuncia e paga pelas publicações (ou transmissões, no caso do rádio e da TV). Esse ruído pode se dar mais ou menos intensamente, equalizando o poder do mercado e a forma de produção e distribuição da informação em relação à independência editorial.

A seguir, polarizando esses padrões, temos em uma face da moeda, uma mídia que depende da demanda mercadológica para se sustentar, e por isso, se pauta de acordo com esta e, na outra face, a suposta independência editorial, onde o veículo escolhe, conforme a importância e relevância para o seu público, os assuntos que abordará. Pode-se, então, identificar esses dois tipos de mídia, e como cada uma lida com o público e com a informação.

                        2.1 – Pós-modernidade: convergências e hibridações
No livro de Santaella, Por que as comunicações e as artes estão convergindo? (2005), a autora aponta para as consequências que a cultura de massa, propiciada após a revolução industrial e as técnicas de reprodução de bens simbólicos, ou máquinas semióticas, – principalmente a prensa mecânica, a máquina fotográfica e o cinematógrafo –, trouxeram para as comunicações e as artes.

Neste período, o que era – desde o Renascimento –, distintamente divido entre cultura erudita e cultura popular, passou a se entrecruzar, assim como as formas de comunicação e de arte. "As artes foram crescentemente incorporando os dispositivos tecnológicos dos meios de comunicações para sua própria produção", como os dadaístas que se apropriaram da fotografia (SANTAELLA, 2005, p. 12). Por outro lado, os meios também absorveram a arte, como vemos, por exemplo, no caso da televisão que se apropriou de linguagens artísticas e da música para a produção de video clips (ibid., p. 52).

Estes processos de convergência e hibridação, que hoje encontram-se no patamar da arte digital e no jornalismo colaborativo, construíram um teia de cooperação onde, ao mesmo tempo em que "cada vez mais as mídias desempenham um papel crucial no sucesso de uma carreira [artística]", elas se sustentam pela arte, a ver os canais de televisão especializados em gêneros específicos de filmes, óperas e concertos, ou a publicidade que incorpora a imagem artística mesclada à imagem do produto, e imita o estilo e o modo de compor da arte (ibid., p. 15 e 43).

Vale salientar a diferença entre convergência e hibridação: Enquanto convergência significa a "ocupação [de duas ou mais estruturas diferentes] de territórios comuns, nos quais as diferenças se roçam sem perder seus contornos próprios" (ibid., p. 7), hibridação significa a mescla, a adaptação de uma estrutura ao se fundir com outra; está relacionado à transformação de um antigo paradigma em algo novo, uma cultura, ora pura, ora impura. Nas palavras de Nestor Garcia Canclini (antropológo argentino em quem Santaella apoia-se para elaborar sua teoria sobre a cultura das mídias [SANTAELLA, 2003, p. 12]), existem "três processos fundamentais para explicar a hibridação: a quebra e a mescla das coleções organizadas pelos sistemas culturais, a desterritorialização dos processos simbólicos e a expansão dos gêneros impuros" (CANCLINI, 1997, p. 283).

Esses fenômenos, típicos da sociedade contemporânea pós-moderna, são demarcados por John Walker, no livro Art in the Age of Mass Media (1994)[7] pelas seguintes características: A pluralidade de estilos; a intertextualidade de discursos de diferentes períodos e estratos; a decoratividade; a complexidade, contradição e ambiguidade; a arquitetura e o design agora concebidos semioticamente como signos capazes de comunicar mensagens; o hedonismo, através do lúdico, do humor e do ornamento; e as misturas entre estratos culturais, artes aplicadas e comerciais (SANTAELLA, 2005, p. 47).

A reverberação destas características sociais no jornalismo pode ser positiva, pois permite, ao jornalista, mais liberdade de criação, ao criticar ou reportar um trabalho artístico, apropriando-se de diversas linguagens e técnicas, e podendo, assim, deixar o texto mais interessante, sofisticado e esclarecedor. Santaella acredita que, "alimentar o separatismo" entre as comunicações e a arte "conduz severas perdas" para os lados: para a arte "porque ela fica limitada pelo olhar conservador que leva em consideração exclusivamente a tradição de sua face artesanal" e, para a comunicação, porque esta "fica confinada aos estereótipos da comunicação de massa" (SANTAELLA, 2003b, p. 9).

            3 - A imprensa alternativa 
É importante ressaltar que o termo alternativo (assim como cultura, e mais ainda quando se refere à arte e à cultura) é por demais elusivo, podendo ficar vulnerável à conveniência de cada um. Em outras palavras, o que pode ser alternativo para alguns, é mainstream para outros. Porém, o empirismo aqui é pouco importante, e assim, devemos nos ater ao desenvolvimento desta definição com base em estudos prévios sobre o assunto.

Outro fator que pode provocar confusão é a existência do mercado de segmentação. Apesar de publicações alternativas também serem feitas pensando em um público ou fenômeno específico[8], elas têm marcas de ruptura com a ideologia dominante, com novas ideias e linguagens ainda não exploradas pela grande imprensa.

No Brasil, esse jornalismo, considerado "lado B" ganha pouca atenção, tanto na mídia como na academia, e, normalmente, quando abordado, é vinculado à blogsfera (SÁ, 2010), ao Jornalismo de Guerrilha (CHINEM, 2004) ou a Movimentos Sociais (GÓES, 2008). Vejamos brevemente estes três casos discutidos no País e, depois, sua definição conforme Atton e Fuchs

·       Blogsfera: É a forma de jornalismo mais independente que se conhece hoje. Pode ser feito por qualquer cidadão alfabetizado e que tenha acesso à internet. É o ponto máximo da democratização da informação, em que pessoas que não se veem representadas pela mídia tradicional têm voz ativa. Além disto, é caracterizado pela velocidade de publicação, recepção e feedback da mensagem.

·       Jornalismo de Guerrilha: Prática jornalística que se opunha à ditadura (1964-1984) no Brasil. Era feito por estudantes e intelectuais, que distribuíam o conteúdo em forma de panfletos ou tabloides. Entre as publicações mais importantes estão O Pasquim, Opinião e Movimento.

·       Movimentos Sociais: Em um artigo publicado na revista da Universidade da Bahia, o jornalista Laércio Torres de Góes (2008), analisa as características da mídia alternativa a partir da observação de duas agências de notícias comprometidas com os movimentos antiglobalização. Estes movimentos que flertam com o ativismo ecológico e o Culture Jamming[9] são os mais próximos que temos hoje de uma "contracultura". Para Góes, mídia alternativa é aquela que "privilegia o seu potencial transformador como instrumentos reflexivos de práticas de comunicação em redes sociais."

O segundo e o terceiro itens citados acima, apesar de serem classificados como jornalismo alternativo pelos autores, Chinem e Góes, de acordo com Atton são exemplos de jornalismo radical. Para este último, "radical" alenta a preocupação com mudanças (ou revoluções) sociais, enquanto "alternativo" pode ser aplicado de maneira mais ampla[10].

O costume e a prática da mídia alternativa na década passada parecem ter cunhado alternativo como a palavra preferida. Como um termo abrangente, sua força reside no fato de poder envolver mais que radical ou publicação de mudanças sociais; pode incluir revistas de comportamento alternativo, uma grande variedade de fanzines e pequenas tiragens de edições de poesia e ficção. Empregar alternativo como um termo analítico, pode nos proporcionar um pouco mais de especificidade que dizer não mainstream”. (ATTON, 2002, p. 10)

Atton (2002, p. 27) fornece um conjunto de características que pode classificar uma mídia como alternativa: conteúdo (radical, seja ele político ou cultural e noticioso); forma (gráfica/linguagem visual, estética e variedades de representações); uso de inovações reprodutivas/adaptações (utilizando-se de toda a tecnologia disponível); meios de distribuição alternativos e caráter anticopyright; transformação dos papéis sociais e relações (organizações coletivas e não profissionalização - por exemplo, jornalista, editor, impressor); transformação do processo de comunicação - em rede).

Este conjunto de especificações podem nos ajudar a definir uma publicação como alternativa com base em suas práticas de produção. Unindo este trabalho à visão marxista de Fuchs, é possível se aproximar de uma definição conceitual mais abrangente de mídia alternativa. Para ele, essa mídia "não deve ser entendida somente pelas práticas [...], mas também como uma mídia que questiona a sociedade dominante." (FUCHS, 2010, p. 174). Isto é o que ele chama de "mídia crítica" e a define como provedora de conteúdo:

[...] que mostra as possibilidades reprimidas de existência, descreve os antagonismos da realidade e potencialidades para a mudança, questiona a dominação, expressa os pontos de vista de grupos e indivíduos oprimidos e dominados, e defende o avanço para uma sociedade cooperativa. A forma do produto da mídia crítica visa a promover a imaginação, ela é dialética, pois envolve a dinâmica, não identidade, a ruptura e o inesperado. (FUCHS, 2010, p.  189)

Fundamentado nos processos de recepção, que determinam a interpretação de uma mensagem, propostos por Stuart Hall (1999 apud FUCHS, 2010) - indeterminismo (onde o significado é negociado), determinismo (significado hegemômico) e oposicional (significado contraditório) - Fuchs ainda sugere mais dois processos: a recepção manipulativa e a crítica.

No primeiro caso, o conteúdo é interpretado de maneira a criar uma falsa consciência. No segundo caso, o conteúdo é interpretado de maneiras que permitam aos destinatários questionarem a dominação". (FUCHS, 2010, p. 179)


Uma questão de difícil abordagem quanto às mídias alternativas é a de seu financiamento. Devido a sua estrutura e alcance limitado, essas mídias têm dificuldade em levantar recursos e, muitas vezes, influenciadas pelo segundo filtro de notícias de Chomsky e Herman - a propaganda como principal fonte de recursos da mídia de massa -, recusam anunciantes, por apoiarem políticas dominantes, neoliberais (ATTON, 2002, p. 37).

Um dos grandes críticos da imprensa alternativa é o grupo Comedia[11], cujo artigo "A Imprenssa Alternativa: O desenvolvimento do subdesenvolvimento" ("The alternative press: The development of underdevelopment", 1984) aponta como motivo do "fracasso" a "incapacidade ou indisposição da imprensa alternativa em adotar métodos de planejamento financeiro e organização [...] capazes de sobreviver ao mercado" e, portanto, "condenado à existência marginal" (ATTON e HAMILTON, 2008, p. 33-34).

O fato de que o setor é tão pequeno tem várias consequências: primeiro, há uma quantidade muito pequena de dinheiro no setor. Os envolvidos na cadeia produtiva (desde a concepção até escrita, o projeto, a composição de layout, a impressão, a publicação, a distribuição, o varejo) não produzem dinheiro suficiente para ser capaz de pagar salários razoáveis​​, o que restringe o tipo de pessoa que pode ser empregado - normalmente um jovem solteiro sem compromissos. Além disso, com tão poucas oportunidades de trabalho no setor é muito difícil para as pessoas ampliar o alcance de suas habilidades, e aqueles com aspirações a fazê-lo tendem a abandonar o setor para obter uma renda acima do nível de subsistência. (COMEDIA, 1984, p. 96)

Este é o caso de mídias comunitárias ou anticapitalistas, mas não necessariamente, o caso da imprensa alternativa voltada para o jornalismo cultural, cujo financiamento é viável mesmo por meio da publicidade, como vemos no caso da revista Vice.

Atton rebate a crítica do Comedia, argumentando com uma afirmação de Downing, a qual diz que muitas vezes uma publicação não tem intenção de sair do "gueto", na "tentativa de praticar princípios socialistas no presente, e não meramente, imaginá-los para o futuro" (DOWNING, 1984, p. 23 apud ATTON, 2008, p. 37).

Um caso atual de sucesso de mídia anticapitalista é a revista de culture jamming, Adbusters. Seus colaboradores são engajados em movimentos ecológicos e anticonsumeristas, e buscam "promover o novo movimento social ativista da era da informação" (ADBUSTERS). Sediada no Canadá, desde 1989, esta revista sem fins lucrativos, circula 120 mil exemplares por mês e é inteiramente financiada por assinaturas e doações.

Em suma, enquanto a grande imprensa busca atingir o maior número de indivíduos possível - tendo nas mãos, pelo menos no caso do Brasil, o problema da educação precária - a imprensa alternativa, de acordo com as premissas apresentadas pelos autores acima, nos mostra a dissidência da ideologia dominante, produzida por indivíduos engajados em causas sociais, e distribuída não apenas em bancas de jornais e livrarias, mas em lugares que proporcionam o debate livre entre a comunidade e a mídia, com o mínino de interferência do sistema político-econômico.

            4 – O jornalismo e a arte
Em dezembro de 2010, na ocasião da 3ª mesa de debates organizada pelo programa Rumos Jornalismo Cultural do Itaú Cultural, foi publicada a revista Princípios Inconstantes, dedicada à reflexão sobre a prática jornalística de cultura. Nela, cinco artigos[12], de diferentes jornalistas do segmento, foram produzidos no intuito de estabelecer aspectos que possam favorecer a crítica e a reportagem cultural. Entre as propostas apresentadas pelos colaboradores, pode-se destacar:

Experimentação
Ousadia
Enfoque / Público
Pluralismo
Simplicidade
Tempo
Inovação / Criatividade
Bons jornalistas
Sintonia
Liberdade
Design
Paixão

Na apresentação da revista, uma frase do jornalista e diretor editorial da publicação aqui em questão, Claudney Ferrreira, me chamou a atenção: "Com as possibilidades digitais, cada vez mais, criar, produzir e veicular informações culturais, se confunde com a própria expressão artística.".

Para entender melhor o que este invólucro dos meios e das artes significa, visitei o autor da frase pedindo que ele desenvolvesse sua afirmação. Este ratificou a teoria da convergência e hibridação, explicando, que hoje, muitos jornalistas e artistas utilizam as mesmas ferramentas de trabalho, tomando como exemplo, os documentários que cumprem as funções jornalísticas e artísticas, como os de Cao Guimarães; as revistas atuais, onde o design, mais do que nunca, é apurado e pensado, sendo fundamental para a comunicação da mensagem; a crítica literária que, quando bem escrita, apropria-se de técnicas criativas de texto; e, mais recentemente, as graphic novels que, desde 2009, têm se destacado com artistas que fazem jornalismo em quadrinhos, como Joe Sacco. Ferreira citou também os cordéis como grande referência da hibridação entre arte e jornalismo.

No entanto, para Ferreira, esta hibridez aparece menos na grande imprensa, que pratica mais o "jornalismo tradicional", através de seus padrões editoriais, que são dignos do trabalho proposto por estes veículos. O que houve de hibridez no jornalismo cultural da grande impressa foi a absorção das celebridades e da polêmica que, antes, eram da seara da imprensa marrom. No entanto, alguns jornais como O Globo, O Estado de S. Paulo e o El País produzem um bom jornalismo cultural quando comparados com a Folha de S.Paulo que, por sua vez, consegue dar mais notícias. Para o jornalista, a grande imprensa se referencia demais na agenda cultural de lançamentos (exposição, filme, livro etc.) desta indústria, sem, muitas vezes, tratar ou discutir o produto.

Já, os veículos especializados pensam "transversalmente" e propõem o debate crítico. Como referência de bom jornalismo cultural, Ferreira cita a revista Trip, a Bravo! e a Piauí, como trabalhos "legais", porém, na internet estão os trabalhos mais interessantes como o site Ubu, que além de textos referenciais, disponibiliza um banco de dados de arte. No mais, a vantagem do meio virtual é que o leitor pode procurar informação específica do nicho que o agrada, possibilitando ainda a interação. Entre os blogueiros recomendados por Ferreira estão Humberto Werneck, José Castello e Luís Antônio Giron – todos colaboradores da grande imprensa.

Para concluir, Ferreira acredita que o jornalismo não tem o dever de beneficiar a arte, mas de desenvolver sua crítica, por meio da ética e da ousadia, para ajudar tanto o leitor como a própria arte a romper preconceitos, e iluminar elementos que não são vistos pelo público, muitas vezes, apropriando-se das técnicas artísticas para elaborar a produção.


          4.1 – A arte da crítica
Como já foi abordado, neste artigo, diversos aspectos do jornalismo cultural – sua abrangência, distribuição, função, história, estilos, agenda, meios, erros e certos – para terminar usaremao um texto que olha para o bom profissional da crítica literária como alguém que pode transcender a arte e, figuramente, a própria vida.

Em 1891, Oscar Wilde – que além de poeta, ficcionista e dramaturgo, era também crítico de arte – publicou, no livro de coleção de artigos, Intentions, "O crítico como artista". Este artigo – que resgata o estilo de diálogos de Platão – apresenta dois personagens com cultura erudita, Gilbert e Ernest, que desenvolvem, numa conversa informal, um tratado de estética da crítica de arte.

Em um ambiente burguês, que tem como cenário a sala de estar e a noite de lua cheia, Gilbert, que apesar de estar muito mais interessado em tocar seu piano para o amigo, conduz o pensamento desaprovando os críticos de arte de sua época por não terem a sensibilidade necessária para praticar tal função. Ernest, entusiasmado pelas ideias de seu amigo, insiste na conversa sobre a história e o rumo da crítica naquele fim de século 19 na Europa.

Quando Ernest afirma que "a faculdade criativa é superior à crítica", Gilbert discorda, dizendo que esta é uma hierarquia instável e arbitrária. "A crítica é em si uma arte", "não há arte sem autoconsciência e, autoconsciência e o espírito crítico são um". Como a arte, a crítica também envolve o trabalho de reformular materiais existentes: Assim como "Shakespeare e Keats não buscam seus temas diretamente na vida, mas o procuram no mito, na lenda e na fábula antiga, os críticos tratam com materiais que outros, como foi, tenham purificado, e já adicionado forma imaginativa e cor".

Gilbert, que acredita que a crítica é elemento essencial do espírito criativo e sem ela não é possível criar arte, diz que o crítico, por sua vez, demanda infinitamente mais cultura para executar sua função, que o artista. O bom crítico, por ter um repertório cultural superior, é capaz de encontrar na obra que analisa elementos que, muitas vezes, não foram percebidos ou foram mal compreendidos até mesmo por seu criador. Já o crítico culturalmente pobre fica "reduzido a repórter da corte policial da literatura, os cronistas dos afazeres habituais do criminoso da arte". Sendo o jornalismo moderno equivalente à mediocridade da arte moderna.

A crítica deve ser subjetiva, independente e puramente impressiva, em oposição à expressão do objeto criticado. Podendo, o crítico, ser um intérprete da obra, não no sentido de repetir a mensagem em outra forma – por exemplo, da escultura para o texto, mas de aplicar suas próprias experiências, pois como uma revelação, apenas pela intensificação do "eu", que entendemos o outro. "Assim como a arte nasce da personalidade, é para a personalidade que ela será revelada, e deste encontro chega-se à crítica interpretativa correta."

Wilde, que em outro artigo do mesmo livro, "The Decay os Lying", escreveu que a "vida imita a arte",[13] afirmando que o crítico pode transcender o mero autoconhecimento por meio da faculdade da interpretação:

[...] com o desenvolvimento do espírito crítico, nós poderemos perceber não apenas a nossa vida, mas a coletividade da vida da raça, e então, nos tornarmos absolutamente modernos, no verdadeiro significado da palavra modernidade. Para quem o presente é a única coisa presente, nada sabe da época que vive. Para compreender o século 19, é preciso compreender todos os séculos que precederam e contribuíram para sua formação. Para saber qualquer coisa sobre si próprio, é preciso saber tudo sobre os outros.


Gilbert justifica e separa a função do jornalismo e da crítica. É no jornalismo que as pessoas encontram a expressão, "nos provendo as opiniões dos não educados e, assim, nos mantendo em contato com a ignorância da comunidade", ficando, então, a encargo da crítica, a concentração da cultura: é ela que "destila a massiva produção artística e a transforma em essência".


CONCLUSÃO


O termo vanguarda, que na arte se destina às criações não ortodoxas e experimentais, pode ser empregado também no jornalismo, assim como em qualquer campo da ciência, contanto que demonstre conhecimento insólito. Vale lembrar que esta palavra vem do francês, avant-garde, e faz analogia à posição dos soldados que ficam na dianteira de uma batalha. Se traduzido no sentido literal, avant significa frente, e garde, guarda, guarda de frente. Ou seja, é a unidade do exército, em português, chamada de infantaria, que, em uma guerra, explora o terreno, busca ocupar posições estratégicas de batalha, monitora e impede o avanço do inimigo, assediando sua desistência.

O jornalismo alternativo tem como umas das principais características ser inusitado e ousado – assim como a infantaria deve agir para surpreender o adversário. Ele busca novas formas de chegar ao público e, quando bem-sucedido, é usada em outros meios. Paulo Francis, por exemplo, que iniciou sua carreira obscuramente, abusando de cinismo e sarcasmo, logo caiu no gosto do público e, a partir de então, colaborou para a grande imprensa. Quando terminou sua carreira, e sua vida, estava na Rede Globo.

A ousadia, tanto na linguagem como na estrutura dos veículos alternativos, abre caminhos e pode reorganizar a ordem estabelecida. No entanto, quando esses veículos ou mesmo os jornalistas e artistas que os produzem, caem no gosto popular, ficam na eminência de perder seu brilho especial e acabarem pasteurizados pela linguagem homogênea do discurso dominante. Um bom exemplo recente de um grupo que perdeu o apelo são os comediantes do programa "Hermes e Renato", que ao deixar a MTV (que apesar de ser do Grupo Abril e à Viacom disponham de liberdade de criação), mudaram drasticamente sua forma de fazer humor, devido às censuras impostas pela sua nova contratante, a Rede Record. A propósito esta não foi a primeira vez que artistas que ganharam reconhecimento na MTV, foram contratados por outros veículos maiores e tiveram sua reputação abalada. Cazé Peçanha, VJ do canal desde 1995, já "ficou na geladeira" da Rede Globo por um ano e meio entre 2000 e 2001, voltou para MTV. Em 2007, ele recebeu uma proposta da Band, mas na ocasião não aceitou alegando ter mais liberdade no canal musical. (LUIZ, 2011) Tendo mudado de ideia, em 2012, onde permanece com o programa jornalístico A Liga. Deve-se notar, no entanto, que algumas vezes a transição de carreira dos apresentadores da MTV são positivas ou neutras para eles. Paulo Bonfá, que ganhou notoriedade como o programa de rádio Os Sobrinhos do Ataíde, em 1995, ficou na MTV entre 2003 e 2010, e  hoje apresenta um programa na SportTV (canal por assinatura da Organizações Globo), sem perder o embalo da sua linguagem usada desde o início de carreira.

A revista Vice é frequentemente criticada por ter "se vendido" para a grande mídia, mas ao analisá-la, temos a impressão que ela conseguiu manter sua proposta um tanto audaciosa para esta sociedade que parece temer o politicamente incorreto. Talvez ela tenha amadurecido no sentido de dar notícias de cunho mais político-social – como acontecem em muitos filmes produzidos pelo seu canal de TV on-line, VBS, e mesmo com artigos na revista[14] – mas ainda assim, ela não abandonou seu tom irônico característico da revista. Em uma matéria no jornal londrino The Independent, o editor internacional da Vice, Capper, diz:

Não é fácil para maiores organizações midiáticas engajarem jovens em assuntos atuais [referindo-se à política], mas a questão está em como este material é apresentado. pessoas por aí que querem aprender, e que não querem ser inferiorizadas. (CAPPER apud Substance over style, 2010)

O estudo mais aprofundado da imprensa alternativa no Brasil, e comparado com mais diversidade de veículos grandes, pode ser muito iluminador neste período de incertezas quanto ao futuro dos veículos e dos profissionais de comunicação devido à crescente oferta de informação, principalmente, on-line e às críticas advindas de grupos como o Block Part e propostas inovadoras como o Miídia Ninja: este estudo pode enriquecer tanto os modos de produção e distribuição, como o discurso ideológico, – pelo "bem" ou pelo "mal" – fundamental para fisgar parceiros e adeptos, nesta sociedade cada vez menos limitada por fronteiras geográficas.





REFERÊNCIAS

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WILDE, Oscar. Intentions. Nova York: Mondial Books, 2007.




[1] TEste livro consta na lista de referências com a edição da Mondial Books, de 2007.
[2]A ORIGEM das palavras. Site de Etimologia. Disponível em: <http://origemdapalavra.com.br/palavras/cultura/>. Acesso em: 27 maio 2011.
[3] The Creator's Project: About 2011. The Creator's Project. Patrocínio: Vice Media e Intel Corporation. Disponível em: <http://media.thecreatorsproject.com/uploads/event_photos/press_release_portuguese_05.18.10.pdf>. Acesso em: 14 jun. 2011.
[4] As noções de "ideias viáveis através da tecnologia" e de "conexão emocional com a ciência" são apropriadas de depoimentos extraídos do vídeo institucional, The Creator's Project: About 2011, do Creator's Project, dos artistas Stefan Saigmeister e Cassette Playa, respectivamente. Ver nota anterior.
[5] Apesar de Jenkins delimitar este fenômeno dentro dos Estados Unidos, pode-se observá-lo também no Brasil.
[6] Alguns exemplos de veículos, além dos blogs amadores, que não são patrocinados por anunciantes, são a BBC e a revista canadense Adbuster.
[7] Citado por Santaella em Por que as comunicações e as artes estão convergindo (2005).
8 Assim como existem revistas segmentadas para o público feminino de classe A, B, C ou D, ou masculino, ou vegetariano, ou erudito, ou adolescente, ou esportista etc.
[9] Culture Jamming é um movimento de conscientização sobre efeitos negativos do consumismo exacerbado no meio ambiente. Os Culture Jammers, por meio da arte, passeatas e intervenções urbanas, atacam a indústria cultural e as práticas abusivas de poder das corporações multinacionais. (LOYD, 2003)
[10] Atton baseia-se no autor do livro Mídia Radical Alternativa - Rebeldia nas Comunicações e Movimentos Sociais (2003), John Downing, cujo trabalho é referenciado frequentemente em estudos sobre o assunto.
[11] Comedia foi criado (originalmente como o Grupo de Imprensa Minoritária) em 1978 para realizar pesquisas sobre os problemas enfrentados pelos jornais comunitários, e por publicações de minoria, tentando entrar no mercado de distribuição de massa. Este artigo foi escrito por Charles Landry, David Morley e Russell Southwood, parceiros da Comedia.
[12] "Movimento do Desassossego", de José Castello; "O Princípio Vital", de Matias Suzuki Jr.; "Efeito Oh!", de Luís Antônio Giron; A Intenção da Virtude", de Mario Helio; e "Paixão e Conhecimento", de Guillermo González Uribe.
[13] Uma das 4 doutrinas do Asteticismo propostas por Vivian –  interlocutora deste outro artigo/diálogo, "The Decay os Lying" com Cyril, que, em suma, são: "A arte nunca expressa nada mais do que ela mesma", "Toda a mea arte provém do retorno à Vida e à Natureza, elevando-as em ideais", "A Vida imita a Arte muito mais que a Arte imita a Vida" e "Mentir e contar coisas belas não verdadeiras é o objetivo da arte."
[14] Filmes sobre a situação política da Libéria, da Coreia do Norte, e entrevista com personalidades como o editor do jornal britânico The Private Eye ou o cinesta Werner Herzog.